Destinos

Sintam essa expedição de perto, por Bruno Senna e demais escaladores:

“Os dedos ardem, trouxemos pouca comida para o acampamento e há 3 dias não tomo um banho. Tudo se torna irrelevante no momento que olho para a vista espetacular das agulhas de granito ao redor do lago de cor esmeralda do Frey.

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Um ano e meio depois da primeira alta montanha na Bolívia, a vontade de explorar novos limites em modalidades diferentes da escalada resultou em uma nova viagem: o Cerro Catedral, ou mais conhecido como a zona do refúgio Frey. Para os desavisados o Frey é um dos picos de escalada tradicional mais famosos da Argentina. No pé da Patagônia o local conta com mais de 50 agulhas de granito! Com vias de alta qualidade, um refúgio com uma equipe que está sempre sorrindo e escaladores do mundo inteiro acampados ao redor do lago. O clima é quase que indescritível. O Frey é uma escola, não só do esporte, mas da cultura e o estilo de vida da escalada.

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Substituições foram feitas – a equipe desta vez contou com os originais Bruno Senna, Caê Benfica e Leo Santiago, e os novos Breno Rates e Daniel Carvalho, vulgo Popó.

Desta vez, foi uma viagem de escalada pura, de aventura “alpina”. O planejamento se ateve a uma lista e reuniões em bares sobre o que levar, o que obviamente resultou em imprevistos, improvisações e sacrifícios, como deixar metade das bagagens em bariloche, por não ter como carregar tudo para o refúgio. Aviso aos navegantes, leve só o que realmente precisar, porque é osso se desapegar de coisas que já estão lá ou ter que fazer que cortar seu livro no meio (retirando que o já foi lido) para diminuir o peso.

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Em Bariloche, cidade onde se chega e se faz as compras da comida para o acampamento, estimamos que os 5 juntos somavam uns 160kg de equipamento, roupa e comida. E para subir com essa bagaça toda? Nesta temporada foi proibido o uso de mulas ou cavalos por turistas – apenas o Refúgio pode usar para subir com suprimentos e descer com lixo. Fomos forçados a arranjar dois porteadores humanos, distribuimos o peso e ainda sobraram uns 18kg. Solução? recrutamos a namorada de um dos porteadores – o que foi realmente constrangedor! A chica levantou a mochila nas costas, e ainda falou que estava tranquilo!

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Para chegar, um ônibus até a estação de esqui do Cerro Catedral, e três horas e meia de caminhada morro acima como burros de carga. Chegando lá, a recompensa: o Refugio Frey, uma cerveja fria a temperatura ambiente, e a paisagem alucinante das 50 agulhas ao seu redor.

A Mansão The North Face (aquilo não pode ser chamado simplesmente de barraca), que foi instalada em posição abrigada dos ventos mais fortes, teve que aguentar ventos pesados, de envergar as barracas vizinhas, chuva, sol e neblina. Mas como nessa casa não tem goteira, ficamos bem tranquilos pra deixar as preocupações apenas na parede.

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O dia a dia por lá é demais! A palavra de ordem é curtição. Dorme-se confortável, acorda assando com o sol na barraca, fora dela o vento te pede roupa própria, café da manha na nossa cozinha improvisada e ampliada para 6 confortáveis lugares. Depois, reunião da comunidade escaladora ao lado do abrigo, troca de dicas e ideias de que agulha e que via escalar, organização de equipamento, e toca-toca pra cima! Entre 40′ e 3 horas de caminhada, voce está em qualquer uma das principais agulhas, com vias 3 estrelas (a graduação de qualidade das vias vai de zero a tres estrelas). No fim do dia todos retornam ao refúgio, degustam um bom vinho compartilhado, conversam sobre as conquistas, alguns se arriscam no violão e quando está frio todos se espremem no refeitório para se esquentar.

Os trios oficiais foram Cae+Bruno+Leo e Breno+Popó+Vítor (paulista, bombeiro de resgate e muito gente boa que encontramos por lá, melhor parceiro de escalada não há, sempre com um sorriso no rosto e boa disposição além do valor agregado de sabermos que se desse alguma merda o resgate já estava lá!).

Escalamos vias TOP, três estrelas sempre que possível, nas agulhas:

1 – A agulha do Frey, que fica em frente ao abrigo, com 5 min. de caminhada, nossa primeira roubada em fenda, com direito a escalada noturna com Lua cheia, e repetições na chuva.

2 – A Principal, desde que ouvimos falar do Frey a imponência do nome Principal ressoava em nossas mentes. Todos queriam chegar ao cume mais importante e alguns membros até clamavam que se emocionariam no topo da agulha. Ela é uma das mais distantes, com 3h de caminhada em pedras soltas,  demoramos 12 horas para escalar e descer… chegando pra mais de 1:00 da manha no acampamento. Mesmo assim, recebidos com palmas pela equipe de festa do refúgio, que nos esperaram com uma garrafa de vinho e abraços para comemorar o dia de glória!

3 – M2, com um dos cumes mais divertidos, mesmo com uma via curtinha, a via tem um visual alucinante, de pano de fundo temos o abrigo do Frey e o seu lago esmeralda.

4 – La Vieja, com uma das vias 3* mais alucinantes e exigentes.

5 – Campanille Esloveno, com uma das paisagens mais incríveis e presenteados por vôos rasantes de um Condor; Abuelo, para constar no currículo.

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Depois de um dia de roubada, ou meio dia, ou nada, tem sempre a opção pela Playa Frey. Sem vento, e no sol, nada melhor que um mergulho pra tirar as cracas no lago de degelo em frente ao refúgio, com a opção de um slack line impossível de dar três passos para meros juniores na modalidade.

Conseguimos nos suportar por sete dias seguidos, com um odor de baby-wipes mascarando o chulé, muita escalada, roubadas, apertos, curtição, piadas, música, vinhos e cervejas, pizzas e macarrones. Mas ninguém é de ferro, e merecemos comer um Bife de Chorizo de primera calidad, na volta para Bariloche! Até a próxima Frey!”

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