Inspiração

Estar na montanha é estar sob pressão o tempo todo. É preciso estar atento, torcer para o clima cooperar, passar frio, sentir dor e ainda ter que conviver com as mesmas pessoas por vários dias, lembrando que elas também estão sob essa mesma pressão. No fim das contas, o que se sabe é que na montanha todos os dias reservam desafios diferentes.

Os brasileiros que estão na expedição Manaslu estão sentindo isso na pele e também já viram casos de outros montanhistas que não aguentaram a pressão e acabaram perdendo a cabeça. No relato mais recente de Bernardo Fonseca ele conta um episódio de briga na montanha e também fala sobre o cronograma da equipe para tentar chegar ao cume da 8ª montanha mais alta do mundo.

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Brasileiros e estrangeiros no acampamento base do Manaslu. – Foto: Bernardo Fonseca

Confira o depoimento na íntegra:

“Cada dia por aqui é um aprendizado e ao mesmo tempo um monte de dúvidas! Nesta expedição, paciência tem sido um ingrediente constante na nossa rotina. Na minha, em especial, mesmo antes de chegar na montanha, lá em Katmandu, tive que me concentrar para não perder o foco, afinal foram sete dias de atraso em função da queda do helicóptero e do mau tempo.

Aqui na montanha estamos vivendo surpresas diariamente, mesmos parados no Acampamento Base, muita coisa acontece! Ontem, por incrível que pareça, aconteceu uma briga de 2 chineses em pleno acampamento 2, a 6.400 metros de altitude. Soubemos pelo rádio que um deles teve o peito atingido pelo crampon e poderia estar com pulmão perfurado. Ficamos de sobreaviso para ajudar, pois a expedição chinesa não tinha médico. Apesar da nossa também não ter, tínhamos mais conhecimentos e o Maximo Kausch estava com seu mega kit de primeiros socorros para auxiliar.

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Os brasileiros ajudaram a socorrer o chinês acidentado. – Foto: Bernardo Fonseca/Arquivo Pessoal

Quando o alpinista chegou, tratamos a ferida, limpamos e bloqueamos para que ele pudesse ir ao hospital em Katmandu via helicóptero no dia seguinte. O medo era de que ele tivesse uma infecção ali, o que era praticamente certo. Então, tinha que tomar antibiótico o quanto antes.

Logo no primeiro horário de hoje, o helicóptero veio e levou o chinês. Em paralelo, uma briga na montanha é algo inadmissível. O agressor ainda se encontra no acampamento 2, mas o que escutamos por aqui é de que ele será preso assim que chegar ao base camp.

Ciclone à vista

Fato é que a montanha é quem manda. Sempre! Nosso forecast avisou que está vindo um ciclone da Índia. Nós não sabemos a que distância ele passará por nós, mas isso influenciará diretamente na quantidade de neve que será depositada no nosso caminho. A pior previsão diz que nesta sexta-feira (21) teremos 75cm de neve e a melhor diz 25cm. Tínhamos previsto fazer uma rotação, chegar a 6.800m e voltar para o base camp, mas com essa previsão de mau tempo, não tínhamos como subir e voltar antes da tempestade. Ou seja, teremos que, mais uma vez, exercer a paciência, ficar no base camp e aguardar passar. O fato positivo é que nossa equipe é a única que já está com equipamentos, oxigênio etc no campo 3.

Pelo cenário que está se desenhando, devemos tentar começar nosso ataque ao cume no dia 22 ou 23. Seguindo, acampamento 1, uma noite. Dia seguinte direto para o campo 3 a 6.800m, dormir uma noite e na sequência partir para o acampamento 4 e cume. Pelo cronograma, a chegada ao cume está prevista para o dia 25! O Arnold comentou que após o dia 27 ou 28, sempre chegam os jet streams, ventos fortíssimos e fim de temporada, aí a montanha não deixa mais subir. Logicamente sempre podem existir janelas, mas não queremos contar com isso.

Todos da equipe estão bem. Alguns fizeram 3 rotações, outros fizeram 2 e eu fiz uma, mas estou confiante na estratégia. Eu estou contando com a minha pré-temporada no Peru para me ajudar nessa missão. Foco! Viver sem risco é triunfar sem glória!”

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O grupo brasileiro está esperando condições climáticas adequadas para tentar o ataque ao cume. – Foto: Bernardo Fonseca/Arquivo Pessoal

 


Escrito por

Thaís Teisen

Jornalista, formada pela FIAM-FAAM, com especialização em Mídias Digitais pela Universidade Metodista de São Paulo. É apaixonada por esportes, natureza, música e faz parte do time The North Face de Conteúdo Digital.