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Chegar ao cume de uma montanha com mais de 8 mil metros de altitude não é tarefa fácil. Lidar com o ar rarefeito e com as condições climáticas adversas é um desafio que costuma levar tempo. Nem sempre é possível fazer ciclos tradicionais de aclimatação para que o corpo se ajuste à montanha. Essa é uma realidade que atinge muitos profissionais e guias de montanha. Com a agenda apertada, passar muitos dias na mesma montanha, pode ser quase impossível em algumas ocasiões.

O guia Eduardo Sartor Filho acabou de passar por essa experiência logo na primeira vez em que subiu o Manaslu. Vindo de uma série de viagens, ele teve apenas 5 dias para chegar à montanha e já atacar o cume, pulando todos os ciclos de aclimatação. Mas, isso só foi possível por ter vindo de uma sequência de outras montanhas de altitude.

Foto: Grade 6

Ele explicou como foi a sua preparação e como é possível conciliar diferentes expedições como forma de aclimatar o corpo para tentar uma montanha mais alta.

Confira abaixo o depoimento e os conselhos do guia:

“Quando se escala uma montanha com altitude extrema, o principal, além do físico e emocional e que faz toda a diferença, é o fisiológico, que pode ser traduzido em uma palavra: aclimatação. A aclimatação pode ser feita de diversas maneiras, mas precisa ser bem-feita, para minimizar os efeitos da altitude em seu organismo durante a escalada.

A aclimatação pode ser dura de alguma maneira e afeta diferente cada pessoa, muitos sentem nos primeiros dias as consequências em seus organismos e levam tempo até chegar a uma adaptação fisiológica ideal para a subida definitiva ao topo da montanha.

Eduardo Sartor no Manaslu. | Foto: Grade 6

A maioria das pessoas faz sua aclimatação na própria montanha com vários ciclos de sobe e desce entre os acampamentos de diferentes altitudes, até que o corpo esteja adaptado e pronto para o ataque ao cume.

Outra possibilidade é fazer essa aclimatação em outras montanhas, em outras cordilheiras e, com isso, chegar na montanha de 8.000 m já aclimatado e adaptado.

Como sou guia de montanha e, por uma questão de calendário, acabei tendo que optar pela aclimatação fora do Manaslu, montanha de 8.156 m, que acabei de escalar.

A minha aclimatação ocorreu nessa sequência: Elbrus (5.642 m) na Rússia, Cotopaxi (5.897 m) no Equador e Sajama (6.560 m) na Bolívia. No meu planejamento, para a aclimatação final antes de seguir para o Nepal, eu deveria dormir 1 noite no cume do Sajama, mas devido ao clima ruim não foi possível, portanto, somente atingi o cume e desci.

Foram dez dias entre a saída da Bolívia até a chegada ao Campo Base do Manaslu (4.750 m). Lá eu me juntei ao Carlos Santalena, Chico Amaral e Henrique Franke, grupo da Grade6 que já estava no Manaslu há algum tempo e com o processo de aclimatação concluído.

Foto: Grade 6

Logo no dia seguinte à minha chegada ao Campo Base, a expedição saiu rumo ao cume, com a intensão de eu subir sem o uso do O2 suplementar.

Do Campo Base seguimos para o Campo 1 (5.500 m) onde pernoitamos. No dia seguinte paramos no Campo 2 (6.200 m) com pernoite, na sequência Campo 3 (6.800 m) e, pelo planejamento, o próximo seria o Campo 4 (7.400 m) antes de atacar o cume.

Cume do Manaslu. | Foto: Grade 6

Quando chegamos ao Campo 3, vimos que a previsão para aquela madrugada estava ótima, para o ataque ao cume e na data prevista e nos dias sequentes não estaria tão boa. Isso complicou um pouco a minha aclimatação, pois pularia 1 dia de exposição a 7.000 m, algo muito importante nesse processo. Porém, apesar desse contratempo, decidimos sair dali mesmo, indo dos 6.800 m direto para o cume. Sai sem O2, mas como ainda não tinha me provado em altitude tão extrema, tive que aos 7.550 m colocar O2, para continuar no ritmo de todos que estavam no grupo. Cheguei cansado ao topo, fiz uma ligação via telefone satelital ao meu pai no Brasil, informando que todos haviam chegado ao cume, depois de algumas fotos e vídeos, descemos de volta ao Campo 3, onde pernoitamos. Todo o processo de ataque e volta do cume totalizou 15 horas de caminhada. No dia seguinte descemos até o Campo Base, fechando a expedição de 8.000+, que pra mim durou apenas 5 dias.

A conclusão a que cheguei é que, sim, é possível fazer uma montanha de altitude em tão pouco tempo, desde que haja um bom planejamento!”

Foto: Grade 6

Escrito por

Thaís Teisen

Jornalista, formada pela FIAM-FAAM, com especialização em Mídias Digitais pela Universidade Metodista de São Paulo. É apaixonada por esportes, natureza, música e faz parte do time The North Face de Conteúdo Digital.